Cirurgia bariátrica e aspectos psicológicos dos pacientes e familiares

O paciente com obesidade é uma pessoa que já está fragilizada e chega para a cirurgia bariátrica sofrendo estigma e preconceito. O primeiro cuidado é o de receber este paciente sem julgamentos ou pressupostos do tipo “mas você tem certeza que já fez de tudo para emagrecer?”. O paciente se sente menosprezado em sua história de vida e com a dificuldade em lidar com a obesidade. Grande parte das pessoas que sofrem com a obesidade já passou por inúmeras dietas, tomou medicação, se lesionou na academia ou recebeu sugestões incríveis dos familiares e amigos que se preocupam e acreditam estar ajudando a “resolver o problema do peso”.

Muitas vezes existe neles a crença de fracasso e inadequação e muitos sofrem preconceito dentro mesmo da família e daqueles que deveriam, a priori, acolhê-lo.

A partir de 2013 a obesidade é considerada doença pela Associação Médica Americana e consta no Código Internacional de Doenças (CID) com o número E66 – obesidade devida a excesso de calorias. Trata-se de uma doença multifatorial e necessita de tratamento multiprofissional. Engana-se quem pensa que dieta e exercícios darão conta de solucionar essa complexa questão.

O mais indicado para pacientes que sofrem com obesidade e pretendem se submeter à cirurgia bariátrica, é que façam o acompanhamento pré e pós cirúrgico com uma equipe especializada. Preferencialmente, o cirurgião deve ter sua própria equipe ou encaminhar o paciente para uma equipe de sua confiança que seja composta por nutricionista, psicólogo, fisioterapeuta ou educador físico e psiquiatra. Além desses profissionais, será necessário passar por cardiologista, ortopedista, endocrinologista e conforme as comorbidades, será indicado mais algum especialista.

Trata-se de um tratamento complexo e longo. O paciente precisa saber que essa escolha envolve dedicação, mudança de hábitos já arraigados e uma série de adaptações ao momento que está por vir.

O procedimento é rápido e seguro e a recuperação física, relativamente breve. Porém, o estado emocional do paciente fica instável e vulnerável. Isso ocorre, além de outros fatores, por conta da nova maneira de alimentação que a cirurgia exige. A pessoa que antes da cirurgia e durante grande parte de sua vida alimentou-se de uma forma específica, terá toda a sua rotina alimentar alterada. É importante investigar o comer emocional, ansiedade, comer noturno, compulsão alimentar, comportamento beliscador ou outro comportamento alimentar que esteja propiciando o ganho de peso. Além disso, é preciso ficar claro que será necessário manter uma alimentação balanceada e uma vida ativa fisicamente para que não haja recidiva de peso.

Outro fator importante a ser investigado e conversado é sobre a participação dos familiares mais próximos. Existem famílias colaborativas e outras nem tanto. O ideal é que a família se envolva no processo e participe das consultas médicas para que entenda o que vai acontecer. A família precisa saber que após a cirurgia o paciente passará alguns dias sem poder comer comida sólida, sem poder beber bebida alcoólica por alguns meses e estará instável emocionalmente. Por vezes, triste e desconfortável por não mais poder comer como antes da cirurgia. Será melhor evitar festas e encontros familiares que envolvam comida nos primeiros dias do pós cirúrgico. Algumas famílias avaliam que é um processo individual e que diz respeito apenas a quem opera, mas a alimentação faz parte da cultura e dos costumes familiares transgeracionais. Quase todas as reuniões familiares envolvem interação com a alimentação. Com a colaboração dos familiares, esse processo pode ser tranquilo e até agradável. Descobrir novos alimentos, maneiras diferentes de preparo, conhecer novas possibilidades de interação, são momentos a serem compartilhados com as pessoas mais próximas. O paciente se sente acolhido e o processo fica menos difícil.

O ser humano vive em grupo e se constitui a partir da interação com o outro. O grupo familiar é onde as experiências podem acontecer com mais tranquilidade se todos estiverem entendendo e colaborando uns com os outros.

 

 

 

Renata Rodrigues Arnoni, CRP/06-112490

Psicóloga Clínica e Psicanalista. Sócia da Sociedade Brasileira de Psicologia (SBP). Integrante da Comissão de Especialidades Associadas (COESAS) da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM). Membro da Equipe de Cirurgia Bariátrica e Metabólica do IMEC – Instituto de Medicina e Cirurgia. Membro da equipe de atendimento psicológico do Núcleo de Atenção aos Transtornos Alimentares (PROATA) da Universidade de São Paulo (UNIFESP). Membro da Clínica Cybelle Weinberg de Estudos e Pesquisa em Psicanálise da Anorexia e Bulimia (CEPPAN). Instagram: @rearnonii.

 

 

 

 

 

Referências:

  1. ARATANGY, E., BUONFIGLIO, H. (2017). Como lidar com os Transtornos Alimentares: Guia prático para Familiares e Pacientes. São Paulo: Editora Hogrefe, 2017.
  2. LEVY, A. (2014). Cirurgia Bariátrica: Manual de Instruções para Pacientes e familiares. São Paulo: Editora M. Books, 2014.
  3. https://minhasaude.proteste.org.br/obesidade-doenca-cronica/
  4. https://cid10.com.br/%5Ebuscadescr$?query=obesidade
  5. PEREIRA, A., FREIRE, C., GODOY, E., VIEGAS, F., MARQUESINI, J., ZANELLA, M. (2019). Cirurgia Bariátrica e Metabólica: Abordagem Multiprofissional. Rio de Janeiro: Editora Rubio, 2019.