Comportamento familiar e a culpa em relação aos transtornos alimentares dos seus filhos

Quando um paciente com diagnóstico de transtorno alimentar chega ao tratamento, já nas primeiras consultas, a família pergunta para equipe multidisciplinar como poderiam ajudar, seja no tratamento ambulatorial ou na internação. A resposta é sempre a mesma: devem ajudar muito, desde o início do tratamento até a alta.

Nos primeiros encontros com o terapeuta familiar, um dos primeiros assuntos que surgem na maioria dos casos é a culpa, “Mas o que fizemos de errado? ”, ” Será que poderíamos ter evitado isso?”. Esses mecanismos fragilizados pelo desconhecimento dos familiares ficam permeados por sentimentos de raiva (“ Porque isto aconteceu conosco?”) e /ou de impotência  (“Não sabemos mais o que fazer!”). Portanto, é essencial ajudar a família a transformar a culpa (paralisante) em sentimentos de responsabilidade e participação, permitir que a ela reconheça que o paciente está de fato doente.

Sendo assim, a família percebe no paciente a necessidade de tratamento, compreensão, carinho, e principalmente disposição para o diálogo.  Essa mesma compreensão facilitará ao paciente a aceitar a ajuda dos médicos, nutricionistas, psicólogos responsáveis pelo caso.

É importante que pais e familiares compreendam que frases como ”Come só um pouquinho” e “É só você se esforçar…” podem gerar atritos desnecessários. Faz parte do processo do tratamento, entender que não querer comer, ficar bravo e outras coisas, estão relacionadas aos sintomas da doença, e que talvez seja importante ir tirando o foco dos sintomas, da comida, das diferentes formas de alimentação e dietas, e começar a pensar na importância de estabelecer horários fixos e definidos para as refeições e quando possível com todos os membros da família.

Em situações que os pacientes se recusam a sentar à mesa, os familiares podem responder por exemplo desta forma: “Come primeiro e depois senta na mesa conosco porque sentimos muita tua falta quando você não participa do almoço familiar”. Estabelecer limites firmes é de extrema importância pois além de favorecer o crescimento ajuda o desenvolvimento da autoestima, e controlar impulsos, permitindo uma organização mais adequada.

Não falar de comida permite abordar outros temas, e reduz a tensão e discussões. Pode ser um momento para encorajar o paciente a descobrir seus próprios recursos, compartilhar dificuldades e conflitos que esteja passando no momento do tratamento.Sendo algo de extrema   importância conseguir mostrar a diferença entre cuidar e controlar.

A participação da família no tratamento tem se mostrado muito eficaz no tratamento de crianças e adolescentes com diagnóstico de transtornos alimentares. Motivar e engajar a família dos pacientes para participar do tratamento, constitui um importante instrumento para a equipe terapêutica, pois abre a possibilidade de questionar e/ou modificar a dinâmica familiar, sendo benéfica para o paciente, e também para o crescimento do grupo familiar como um todo.

 

 

Alicia Weisz Cobelo

Supervisora da equipe de psicologia do PROTAD – Projeto atendimento, ensino e pesquisa em transtornos alimentares na infância e na adolescência do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da faculdade de Medicina da USP (IPq-HC-FMUSP). Membro da Academy for Eating Disorders (AED). Membro do Capítulo Hispano-Latino Americano da AED. Membro colaborador da Clínica de Estudos e Pesquisas em Psicanálise da Anorexia e Bulimia (CEPPAN).

 

 

 

Referências:

COBELO, A. A família na anorexia nervosa e na bulimia nervosa. In: CordasT, CobeloA, FleitlichB, GuimaraesD, SchomerE.Artes Médicas, 1998.p 51-59.

COBELO, A. O papel da família no comportamento alimentar e nos transtornos alimentares. In:AlvarengaM, PhilippiST. Transtornos Alimentares: uma visão nutricional.Ed Manole. 2004p.119-129.

COBELO, A. A importância da inclusão da família no tratamento multidisciplinar dos transtornos alimentares na infância e adolescência. In: Weinberg C. Transtornos Alimentares na infância e adolescência uma visão multidisciplinar. Sá Editora 2008.p115-130.

 


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