Suicídio e transtornos alimentares

Nesse mês de setembro é feito um grande esforço para divulgar mensagens que possam levar o tema suicídio para uma ampla discussão, promovendo espaços para conversas, reflexões e principalmente acolhida.

Pensar sobre suicídio é entender que os transtornos psiquiátricos, além de apresentarem muitos prejuízos nos aspectos físicos, emocionais e sociais, também estão relacionados a elevadas taxas de mortalidade por suicídio (95% dos casos e em mais 90% nas tentativas e representam 15 vezes mais risco em comparação com a população o que não tem diagnóstico psiquiátrico).1

Entre os transtornos psiquiátricos que apresentam mais tentativas ou chegam a cometer suicídio de fato, estão a Depressão, Transtorno Afetivo Bipolar, Dependência Química, Esquizofrenia, Transtornos de Personalidade, Transtorno do Estresse Pós-traumático, Transtornos de Ansiedade e os Transtornos Alimentares (TA) com Anorexia e Bulimia nervosa. 1,2,3

Vale ressaltar que esses transtornos quando recebem um diagnóstico precoce e tratamento adequado favorecem a melhora dos sintomas e assim podem evitar comportamentos suicidas.

A respeito dos Transtornos alimentares há uma diferença quanto a tentativas e suicídio, sendo os casos de Anorexia Nervosa com mais mortes e Bulimia Nervosa com mais tentativas. Cada um desses diagnósticos tem aspecto similar e sem relação aos sintomas e população acometida, entretanto todos apresentam dificuldades graves para manter uma alimentação adequada, angústia quanto ao peso ou forma do corpo e por consequência um maior risco para complicações clínicas graves.2,3,4

A vulnerabilidade para o suicídio nos TA é muito elevada devido as condições que o paciente está diante da vida com os pensamentos girando unicamente sobre peso, comida e formas de controle que levam a uma vivencia diária do medo de engordar. O sofrimento é tamanho que quase 95% dos casos apresentam comorbidades com outros transtornos entre eles a Depressão, Ansiedade e uso de substância principalmente o álcool.2,3,5

A Anorexia Nervosa é considerada entre os Transtornos Psiquiátricos, um dos com maior mortalidade chegando a 5 mortes por ano e taxas de suicídio em torno de 20 a 40%. Quando comparado com a população geral o risco é 23 vezes maior nesse diagnóstico.3,5

Pacientes com Anorexia Nervosa geralmente apresentam os primeiros sintomas no início da adolescência sendo predominantemente em meninas, justamente na fase da vida que acontecem grandes mudanças tanto físicas como emocionais. O transtorno limita e domina os pensamentos na busca de controle para ter um corpo perfeito, e assim prejudica em muito a qualidade de vida desses pacientes.3

A atenção para esses casos está na vulnerabilidade diante de um quadro clínico comprometido de desnutrição que possibilita maior letalidade para uma tentativa de suicídio. As comorbidades associadas e características de personalidade também podem dificultar uma melhor crítica sobre a doença, e consequentemente dificultar mudanças nos comportamentos rígidos e restritivos.2,5

Já a Bulimia Nervosa apresenta uma taxa menor de mortalidade,1,7 por 1000 casos-ano, no entanto são elevadas as tentativas de suicídio que no curso da doença podem ocorrer em mais de 35% dos pacientes.2,5

Pacientes com Bulimia Nervosa geralmente apresentam os primeiros sintomas no final da adolescência e início da fase adulta, mas demoram mais para chegar no tratamento. O medo de ganho de peso é apavorante, levando a uma restrição, muitas vezes seguida de compulsão ou ingesta de alimentos proibidos que levam a busca de métodos compensatório como provocar vômitos, uso de medicações para provocar a perda de fluídos corporais, inibidores do apetite, exercício físicos intensos e uso de drogas ilícitas.3

Os comportamentos mais impulsivos nesses casos representam o maior desafio para prevenir um suicídio, principalmente quando associados ao uso de substâncias como drogas e álcool.2,5

Mas o principal desafio para prevenção ao suicídio, não só nos TA, está na mudança de postura tanto dos profissionais de saúde, familiares e amigos no entendimento que um transtorno mental deve ser levado a sério, que não é algo que o paciente deseja, mas muitas vezes é um prisioneiro da situação.

Acolher é um grande começo para uma ajuda, que vai exigir um não julgamento e por fim grandes doses de empatia. Seria assim uma ótima prescrição para todos nós.

 

Michel Indalécio de Souza

Terapeuta Cognitivo Comportamental

Colaborador no Ambulatório de Transtorno Alimentares /Ipq-HC/USP

Co-autor do livro Como lidar com o risco de suicídio

 

 

 

Referências:

  1.  Cordás et al. Como lidar com o risco de suicídio. Editora Hogrefe, São Paulo 2020
  2.  Veras JLA, Ximenes RCC, Vasconselos FMN, et al. Relação entre comportamento suicida e transtornos alimentares: uma revisão sistematizada. Rev Fund Care Online. 2018; 10(1):289-294.
  3.  Aratangi e Col. Como lidar com os Transtornos Alimentares. Editora Hogrefe. São Paulo 2018
  4.  American Psychiatry Association (APA). Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM-V). Washington DC: American Psychiatry Association; 2014.
  5.  Arcelus J, Mitchell AJ, Wales J, Nielsen S. Mortality Rates in Patients With Anorexia Nervosa and Other Eating Disorders: A Meta-analysis of 36 Studies. Arch Gen Psychiatry. 2011;68(7):724–731.

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